nucibus relictis...

quinta-feira, junho 23, 2005

Tempo…


Se … por um momento, ainda que por um pequeno momento, um milésimo de segundo apenas, pudesse tornar infinito o tempo… aquele tempo em que acariciavas a minha face e despias o meu olhar dos seus segredos…

O tempo… aquele tempo em que fui eternamente tua e o macio do teu toque meu… o tempo em que de dois se fez um numa melodia insana…

O tempo… em que não existiam barreiras… aquele tempo, sem espaço,… nem tempo… onde a circunstância fora como a água tépida que nos percorre o corpo e acaricia a alma…

O tempo… o tempo que creu, o tempo que sorriu, o tempo em que desabrocharam os girassóis e os pássaros cantaram… aquele tempo, em que te amei pura e languidamente sem restrições…

O tempo… aquele tempo, que da saudade se fez dor, e da lágrima o choro…

Tu és o tempo e eu sou o tempo… sem tempo já…

Quero-te tanto, no desejo da madrugada intensa… corpo cruel e insano… que me pedes?!

Sofrimento e dor? Rebelião? Arte? Prazer?... talvez somente SAUDADE...

quarta-feira, junho 22, 2005

Saudades...


Posted by Hello

domingo, junho 12, 2005

Ânsia por VINICIUS de MORAES

Ânsia

Na treva que se fez em torno a mim
Eu vi a carne.
Eu senti a carne que me afogava o peito
E me trazia à boca o beijo maldito.
Eu gritei.
De horror eu gritei que a perdição me possuía a alma
E ninguém me atendeu.
Eu me debati em ânsias impuras
A treva ficou rubra em torno a mim
E eu caí!

As horas longas passaram.
O pavor da morte me possuiu.
No vazio interior ouvi gritos lúgubres
Mas a boca beijada não respondeu aos gritos.

Tudo quebrou na prostração.

O movimento da treva cessou ante mim.

A carne fugiu
Desapareceu devagar, sombria, indistinta
Mas na boca ficou o beijo morto.
A carne desapareceu na treva
E eu senti que desaparecia na dor
Que eu tinha a dor em mim como tivera a carne
Na violência da posse.

Olhos que olharam a carne
Por que chorais?
Chorais talvez a carne que foi
Ou chorais a carne que jamais voltará?
Lábios que beijaram a carne
Por que tremeis?
Não vos bastou o afago de outros lábios
Tremeis pelo prazer que eles trouxeram
Ou tremeis no balbucio da oração?
Carne que possui a carne
Onde o frio?
Lá fora a noite é quente e o vento é tépido
Gritam luxúria nesse vento
Onde o frio?

Pela noite quente eu caminhei...
Caminhei sem rumo, para o ruído longínquo
Que eu ouvia, do mar.
Caminhei talvez para a carne
Que vira fugir de mim.

No desespero das árvores paradas busquei consolação
E no silêncio das folhas que caíam senti o ódio
Nos ruídos do mar ouvi o grito de revolta
E de pavor fugi.

Nada mais existe para mim
Só talvez tu, Senhor.
Mas eu sinto em mim o aniquilamento...

Dá-me apenas a aurora, Senhor
Já que eu não poderei jamais ver a luz do dia.



Vinicius de Moraes
Rio de Janeiro, 1933
in O caminho para a distância
in Poesia completa e prosa: "O sentimento do sublime"